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sábado, 20 de outubro de 2012

Cap.4 - O efeito Big Brother

Estávamos na véspera de nosso traslado de Maceió para Piranhas. Os desgastes da perda do Niltão e da confusão de última hora para organizar o transporte preconizavam os dias turbulentos que teríamos pela frente. O que acontecia era que havia duas visões diferentes sobre uma travessia daquele porte.
Para mim, não poderia haver surpresas, pois é o desconhecido que sempre te atrapalha lá na frente. Eu fazia questão de antecipar tudo, de prever o que fosse possível, de modo a evitar o inesperado. Isto faz parte de minha formação anterior. Aprendi muito com minha Travessia do Canal da Mancha e sabia que não se pode dar moleza para o imprevisto.
Neste ponto nossos estilos - meu e do Foschini - eram distintos. Não quero dizer que meu companheiro não planejava os eventos - pelo contrário, acho que ele se empenhou, e muito, na consecução de nossos objetivos. No entanto, em algumas situações eu esperava mais e, nestas horas, eu ouvia um "Na hora a gente vê o que faz" que me deixava bastante preocupado.
Pois aquela fatídica e desgastante noite foi a primeira amostra desta diferença de estilos. No caminho de volta do hotel, onde deixamos Niltão e Santa Cristina, para a casa do Foschini, iniciamos uma discussão sobre o projeto, onde eu afirmei algo do tipo:
- Vamos até o final com este projeto, mas O MODELO no qual ele foi concebido - onde dependemos demasiadamente das prefeituras locais e, por isso, levamos um cano após o outro - não é o modelo por mim preferido. Eu não farei outros projetos dentro deste modelo. Eu prefiro o padrão da 14 Bis, onde entra um patrocínio (no caso, de nossos valorosos amigos da Praticagem de Santos) além de outras organizações de respeito e garantimos uma boa parte de nosso sucesso.
Pronto! Ao manifestar esta opinião, a confusão estava armada. O Foschini tomou isso como uma questão pessoal e entendeu tudo como uma crítica a ele e não ao modelo de organização. Ao chegar em sua casa, ele acordou o Fabio e o Alessandro, que já dormiam confortavelmente para o dia seguinte e fizemos a reunião mais desgastante de nosso projeto.
O desgaste foi ele ter levado o foco da discussão em torno das pessoas, e não do modelo. O Foschini estava bastante transtornado e falava tão alto que até a Lua - o peixe-boi que nadava a quilômetros dali - poderia ouvir. O desânimo na equipe ficou evidente. De seu lado, ele passou a criticar fortemente o modelo da 14 Bis e, pior, criticar as pessoas - nominalmente - que a organizavam. Ouvi críticas horrorosas a gente tão bem intencionada que são aqui impublicáveis.
Como consequência de minha posição quanto ao MODELO de prova adotado no Velho Chico, o Foschini sentiu-se na obrigação de dizer que também não faria mais a 14 Bis.
- Azar seu - declarei - pois a 14 Bis é uma bela prova e você sabe disso!
Como contrapartida, houve insinuações da parte dele que eu deveria abandonar o projeto. Naquela altura do campeonato, depois de todo o desgaste incorrido, depois de todo o investimento feito e depois das centenas de quilômetros nadados com seriedade e empenho? Certamente que não. Por absoluta aderência à minha declaração inicial de "Vamos até o final com este projeto, mas é o primeiro e último neste modelo", manter esta posição foi a melhor coisa que fiz, não somente para mim, como para todo o projeto, como veremos mais adiante.
Afinal como disse o próprio Foschini: "Quem não se empenhar e treinar seriamente não vai conseguir terminar a prova." - o sentimento de terminar a prova era uma questão de honra. Nadar defendendo uma causa sócio-ambiental é muito bom, mas fazê-lo terminando a prova é muito melhor! Quem é nadador sabe disso. Como eu havia treinado e me empenhado seriamente eu não deixaria essa oportunidade passar. Até por que eu só teria uma chance - naquele ano!
O Alessandro chegou a se manifestar certa vez, muito antes desta confusão, que: "o Percival era o líder intelectual (de planejamento) do grupo enquanto o Foschini seria seu líder emocional, seu coração." - esta frase está relatada em um post neste blog, pouco antes da travessia. Apesar de bem intencionada, sua declaração não foi aceita pelo dito "coração" e só piorou as coisas naquela fatídica noite. Nem mesmo este simples blog se livrou de críticas e agressões verbais, coitadinho. Só quem esteve lá para ver.
A reconciliação veio somente após alguns dias, quando, ambos já com as cabeças mais frias, eu lhe convidei a deixar as diferenças de lado e participar da 14 Bis. Espero que ele, realmente, volte. Se quiser ajudar na organização, melhor ainda - será sempre bem-vindo.
"O esporte deve agregar." São estas as sábias palavras de um grande mestre da natação e amigo próximo. Naquela ocasião e em várias outras ao longo do projeto, passamos por espasmos de manifestações pouco esportivas que, ao final, foram todas apaziguadas com o sucesso do projeto.
Em resumo, fomos do céu ao inferno em poucas horas.
Mas é como dizem: quando começa mal, pode terminar bem. E assim foi.

4 comentários:

  1. Ueba...os relatos estão ficando cada dia mais interessantes. O legal de tudo isso, é que apesar das desavenças, souberam lidar com os problemas para que o objetivo principal mantivesse em primeiro plano. Parabéns !
    Foschini...veremos você na 14 BIS !

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  2. Mas não foi fácil. Nesses momentos em que é necessário "não desintegrar", são os objetivos DO ESPORTE que unem o grupo. Ao final desta fatídica reunião, o pessoal já estava pensando: "vamos deixar essa balela de lado e vamos nadar."
    Não que os objetivos sócio-ambientais não tivessem importância - a mensagem de preservação do rio é muuuuuuuito importante - mas o ESPORTE é a FERRAMENTA que nós, nadadores, oferecemos para engrandecer o projeto de SUSTENTABILIDADE.

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  3. Com certeza ! Eu por exemplo, não tinha idéia de como o Rio São Francisco é belíssimo. Através das fotos de vocês pude conhecer um pouco além daquelas costumeiras dos cartões postais. Tbm tive a oportunidade de ver outras através do blog do Jefferson Sestaro, quando ele participou de provas de canoagem.

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  4. Lucia, você vai ler em breve sobre nosso primeiro dia de natação. Nós tivemos algumas pessoas nos acompanhando de caiaque. O pessoal da região planejava um evento maior, com a Canoa de Tolda singrando aquelas águas e um grupo grande de canoagem para descer o rio. Ao chegar na região fomos informados que a Canoa de Tolda estava em manutenção e somente um caiaque veio participar.
    Mas valeu mesmo assim.

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